segunda-feira, 23 de maio de 2011

Explica-me a beleza, amigo

Um texto que, mesmo para mim, ainda é um tanto confuso, exceto pelo último parágrafo, onde prezei pela simplicidade. Mas quando eu o escrevi, todo ele me fazia muito sentido.

Não tem nome. Que eu me lembre, até agora, é meu único texto sem título.

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"Milhões de anos de evolução para transformar o instinto numa faculdade da razão. Para diferenciar os motivos por que vivem os cachorros e os homens. Para resumir a dor ou frio tudo o que, de fora, pode nos atingir. Para justificar a razão pela qual os homens mudam de opinião e sua capacidade de tornar qualquer coisa em verdade. 

O mesmo privilégio que obriga o caçador a andar contra o vento. O pretexto que sustenta o orgulho com que os homens encaram os ratos. Mas que também é a razão por que medo e receio são sempre as primeiras sensações quando alguma coisa acontece pela primeira vez. E o motivo pelo qual o homem é o único animal que sofre por amor.

Uma caminhada cujo fim sempre estará depois do horizonte. Longe demais para saber se, no destino, haverá mesmo terra para pisar. Uma procissão dos que são ocupados demais para lembrarem-se dos motivos pelos quais caminham. Um reflexo da ignorância de cada homem que sempre é confundido com um extraordinário senso de perseverança comum. A mesma caminhada que deu asas ao peixe e que parece querer dar barbatanas ao homem."

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Milhões de anos de evolução para transformar o instinto numa faculdade da razão. Então, amigo, repare naquela moça de cabelos castanhos sentada ali adiante. Não desonre as almas que um dia aqueceram os corpos empilhados sob seus pés. Mostre-me que é mais do que um bravo matador de ratos.


Ela ignora os sensos e anda suntuosamente como se eles nunca tivessem existido. Faz-te sentir movido por motivos muito mais nobres do que os que costuma experimentar. Como, se bem entendesse, pudesse decretar que a partir de hoje as maçãs cairão para cima. Não dá sentido à sua vida, mas entorpece-te a ponto de cessar seus questionamentos.


Diga-me...


... Que não perdeu o controle da freqüência com que bate seu coração. 
... que suportaria indefinidamente todas as dúvidas que acabaram de surgir-te. 
... que o que sente não é indescritível como o gosto de uma colher de mel 
... e que não é honesto como o motivo pelo qual os cães abanam seus rabos. 


Mas é só uma moça de cabelos castanhos e olhos brilhantes. Não é?


Então... Explica-me a beleza dela e pagar-te-ei uma bebida, amigo.

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 Março/Abril de 2010 

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